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Lauro Bacca: Brasil joga no lixo 50 anos de preservação ao meio ambiente



“Do passado, voltemos ao futuro”: ambientalista e naturalista escreve em artigo no Santa sobre áreas de preservação permanente (APPs)

27/08/2021 - 18h18

Bacca fala sobre projeto aprovado na Câmara dos Deputados e que trata das APPs.Bacca fala sobre projeto aprovado na Câmara dos Deputados e que trata das APPs.(Foto: Patrick Rodrigues, BD)


Quem não se lembra do ex-presidente Collor quando ele disse que nossos carros eram verdadeiras carroças? Foi há 30 anos. De lá para cá a evolução de nossa indústria automobilística foi simplesmente espantosa.

Adeus carroças, viva a modernidade, tchau, obsoletos carburadores! Bem-vindos, motores modernos, controles eletrônicos, catalisadores nos escapamentos e eficiência de 90% no controle da poluição do ar causada pelos veículos que circulam em todas as nossas ruas!

Vamos regredir vinte anos mais, viajemos no tempo até o início dos anos 1970, quando ultrapoluidores motores de dois tempos ainda equipavam muitos modelos da época, tudo junto resultando em dias de poluição que tornavam o ar quase irrespirável nas grandes cidades brasileiras. Bem diferente de agora, quando, mesmo com o triplo de veículos em circulação, a poluição ficou bem menor.

Imaginemos agora nossa moderna indústria automobilística retroceder aos padrões de fabricação e montagem de meio século atrás e voltando a usar a exata tecnologia disponível na época. E que essa volta ao passado seja obrigatória, por força de lei aprovada na Câmara dos Deputados.

Inimaginável, certo?

Errado.

Foi exatamente isso que aconteceu na área ambiental com a aprovação, no último dia 25, do projeto de lei 2.510/19, que trata das áreas de preservação permanente (APPs) nas áreas urbanas, iniciativa de parlamentares catarinenses, justo um dos Estados que mais sofre com as consequências da ocupação desses espaços.

Há que se reconhecer a extrema complexidade da questão e a consequente monumental dificuldade de destrinchá-la, mas, daí, para não enfrentar o problema como deveria ser feito e propor uma salomônica decisão às avessas de cortar o bebê ao meio para que cada pretensa mãe ficasse com sua metade, são anos-luz de diferença.

Sem maiores e profundas discussões e debates, preferiu-se entregar o bebê inteiro à falsa mãe, representada aqui de forma simplificada pelos interesses imediatos do lucro imobiliário.

Tal como na analogia automobilística, a questão das APPs é mais uma em que o Brasil acaba de regredir 50 anos de evolução na área ambiental. Voltamos ao período anterior a 1972, ano da histórica reunião de Estocolmo em que, pela primeira vez, todos os países significativos do mundo reconheceram a premente necessidade de proteção ambiental.

Desprezamos as decisões e recomendações da reunião Rio 92, ou da Rio+20. De uma “canetada”, negou-se a realidade do efeito estufa, das mudanças climáticas, da ameaça como jamais vista à biodiversidade, das chuvas cada vez mais escassas por falta de florestas, do acordo de Paris, dos eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes e violentos, resultando em inúmeras vítimas e perdas materiais, onde? Principalmente nas APP de áreas urbanas!

Todo um avanço científico e tecnológico de 50 anos foi jogado no lixo, para tudo voltar a ser o que era antes de Estocolmo, 1972. Resta esperar que o Senado nos salve desse atraso e nos traga de volta para o futuro. Uma nota técnica assinada por mais de 70 entidades, cientistas e ambientalistas de todo o Brasil, já entregue, pode ajudar os Senadores a uma tomada de decisão mais adequada.

Fonte: https://www.nsctotal.com.br/noticias/lauro-bacca-brasil-joga-no-lixo-50-anos-de-preservacao-ao-meio-ambiente?fbclid=IwAR1PIdnHDF4KjzCRHHlX2DdDJ0s6HDEaL9fycpAzO45rlmsoy9dUlk94HH8