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Blumenau: Muito lixo para pouco ambiente



Detritos são pesados na Parada 1. Foto(s): Rafaela Martins/Santa

O cheiro da decomposição se alastra com o vento. Atraídos pela imundície, ratos e insetos reviram as montanhas de restos de comida e detritos. Mesmo sufocados pelo odor, catadores travam com os animais uma disputa pela sobrevivência. Na luta por um banquete apodrecido, tomam o terreno de 60 mil metros quadrados onde o lixo é descarregado a céu aberto.

A paisagem cinzenta descrita acima reporta a um passado não muito distante. Até 2002, os resíduos sólidos domiciliares coletados no município eram descarregados sobre o solo, sem medidas eficazes de proteção ao meio ambiente e à saúde pública, no lixão da Parada 1, no Bairro Salto do Norte.

Hoje, as 5 mil toneladas de resíduos domiciliares recolhidas por mês em Blumenau são levadas ao aterro sanitário em Brusque. As mudanças na destinação do lixo não afastaram as preocupações com o futuro e a presença de urubus.

No terreno próximo à Rodovia Antônio Heil, no Bairro Barracão, eles aparecem em bandos. Em busca de carniças, são o sinal mais visível de que a tentativa de esconder o lixo debaixo da terra pode não ser a melhor forma de tratar o problema. O procedimento adotado no aterro sanitário exige longa imobilização do terreno.

- Não é garantia de que o meio ambiente não será comprometido. Enquanto não acontecer a redução da produção de lixo, sempre teremos problemas. O planeta não comporta os impactos do consumismo desenfreado e do estilo de vida em que tudo é descartável - alerta a diretora de Educação Ambiental da Fundação Municipal do Meio Ambiente de Blumenau (Faema), Mabeli Espíndola.

Números do Samae mostram que a produção de lixo em Blumenau cresce quase 3% ao ano. Se a tendência se mantiver, nos próximos 10 anos, o município vai gerar 80 mil toneladas por ano.

- Se não mudarmos o atual estilo de vida, vamos ter falta de espaço para disposição e tratamento de resíduos. Cada vez mais, temos encontrado dificuldade em achar áreas apropriadas para isso - avisa o coordenador do programa de pós-graduação em Engenharia Ambiental da Furb, Adilson Pinheiro.

Caminhos
1-Treze caminhões compactadores são responsáveis pela coleta em Blumenau. Eles passam pelas ruas, recolhendo o lixo das residências
2- O lixo recolhido é levado para a estação de transbordo que fica aos fundos do Terminal Aterro, no antigo Lixão da Parada 1. No local, os rejeitos são pesados
3- De estação de transbordo, o lixo é transportado para o destino final, no aterro sanitário em Brusque
4- No aterro, é descarregado e coberto com terra. Os gases - principalmente o metano, que contribui para o aumento do efeito estufa - são queimados e o chorume, a água escura, turva e malcheirosa proveniente do armazenamento do lixo, é tratado antes de ser depositado no Rio Itajaí-Açu. Há uma impermeabilização sintética do solo para impedir a contaminação do lençol freático
5- O lixo é depositado em camadas alternadas de lixo e terra até a superfície


Blumenau despeja 200 toneladas por dia no aterro de Brusque

Montanhas cercadas de verde servem de pano de fundo para o processo de decomposição do lixo, no aterro sanitário de Brusque. Uma cortina formada por árvores de várias espécies esconde a realidade de quem passa pela Rodovia Ivo Silveira. Enquanto os caminhões descarregam o material, um trator espalha e compacta o lixo em parte dos 40 hectares licenciados pela Fundação do Meio Ambiente (Fatma).

Ao todo, 25 funcionários trabalham no local. O aterro sanitário de Brusque é gerenciado pela empresa Recicle Catarinense de Resíduos Ltda, que recebe o lixo de mais de 30 municípios da região. De todos eles, Blumenau é o que envia maior quantidade por mês. São em média, 200 toneladas por dia. O município paga R$ 78 por tonelada de lixo depositada no aterro.

- O impacto ambiental aqui é menor. É o que há de mais moderno no tratamento do lixo no Brasil. Não se percebe, mas isso aqui é uma obra de engenharia sem fim - comenta o engenheiro sanitarista e responsável técnico pela empresa, Galdino Savi.

O engenheiro reconhece que o ideal seria não ter a presença de animais.

47 metros de lixo sob o solo

Durante os quase 30 anos em que o aterro da Parada 1 foi usado como depósito de detritos, moradores e comerciantes conviveram com a agonia da perda de qualidade de vida e até da desvalorização imobiliária. Eles assistiram à proliferação de insetos e se engajaram no movimento em defesa da retirada do lixão do local.

- As moscas eram tantas que não dava nem para dormir. Apagava a luz e elas aterrissavam no rosto. Nem os meus cachorros agüentavam. Não conseguia mais comer dentro de casa. O fedor penetrava até nas roupas guardadas dentro do armário - relata o aposentado Eraldo Bennertz, 67 anos, cuja propriedade faz limite com o antigo lixão.

Uma estimativa do Samae indica que o ponto de maior profundidade no local chega a 47 metros de lixo. Embora os moradores já não sintam efeitos diretos, os impactos só vão terminar quando o lixo se tornar inerte, processo que pode durar décadas.

- Em 1973, quando o terreno foi adquirido pela prefeitura, essa era uma área marginal. Com o passar dos anos, se tornou um centro geográfico. Da rodovia, já se sentia o mau cheiro - explica o engenheiro químico Renan Lindner.

- Comprei um terreno aqui em 1997. Sabia da existência do lixão, mas não conhecia o problema causado por ele. Se soubesse, não teria adquirido. No começo, pensei que tinha algum animal morto na redondeza, era insuportável - comenta o proprietário de uma revendedora de carros próximo ao antigo lixão, Ingo Bork, 42.

Terreno vira estação de transbordo

Em abril de 2005, o aterro da Parada 1 se tornou estação de transbordo e passou a contar com uma Central de Triagem para reciclagem. A partir daí, o lixo recolhido em Blumenau passou a ser levado para o terreno pelos 13 caminhões da coleta. De lá, o lixo é levado por outro veículo até Brusque.

- O lixo sempre foi tratado como problema. Por isso, se preferiu escondê-lo a encontrar uma solução para ele - alerta o ambientalista e biólogo Lauro Bacca.

- O primeiro passo é reduzir a geração de lixo. Se não há condições de não produzi-lo, a opção é reutilizá-lo. E, por último, a reciclagem do lixo. Hoje, as pessoas falam apenas da reciclagem - explica o diretor de operações do Samae, Ramiro Nilson.

Coleta
Resíduos domiciliares produzidos em Blumenau (em toneladas)
2006 : 58.938
2005 : 55.101
2004 : 50.557
2003 : 49.539
2002 : 54.118
2001 : 52.900
2000 : 50.441
Fonte: Samae
Faça sua parte
- Reflita sobre o lixo que você produz diariamente. Que materiais ou produtos poderiam ser evitados ou substituídos para que menos lixo fosse gerado?
- Quando for possível, compre embalagens maiores de produtos de limpeza, higiene e alimentícios, pois eles gerarão menor quantidade de lixo
- Participe de campanhas de limpeza de ribeirões no seu bairro e de motivação da comunidade para destinação adequada do lixo
- Denuncie atos danosos ao meio ambiente praticados por pessoas ou empresas, como deposição em lugar inadequado e queima de lixo
- Leve seu próprio copo para a empresa e não use os descartáveis
- Troque filtros, guardanapos e toalhas de papel pelos de pano
- Evite embalagens de difícil reciclagem, como isopor e papel aluminizado
- Substitua a fralda descartável pela de pano
- Aproveite talos e folhas de verduras e cascas de frutas, diminuindo o desperdício de alimentos
Fonte: ambientalistas e Fundação Municipal do Meio Ambiente (Faema).
Produção
Quantidade de lixo produzida por habitante/dia (em gramas)
Blumenau : 500
Florianópolis : 900
Chapecó : 400
Itajaí : 700
Palhoça : 500
Orleans : 700
Fonte: Diagnóstico de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos - 2005 do Ministério das Cidades.
Depoimentos
Ingo Bork, 42 anos, proprietário de uma revenda de carros ao lado do antigo lixão:"Sabia da existência do lixão, mas não conhecia o problema causado por ele. Se soubesse, não teria adquirido"
Eraldo Bennertz, 67 anos, aposentado que morou ao lado do aterro da Parada 1:"As moscas eram tantas que não dava nem para dormir. O fedor penetrava até nas roupas guardadas dentro do armário"
clicRBS
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